Nesta quarta-feira (4), o deputado Arnaldo Jordy (PPS/PA) solicitou, na tribuna da Câmara Federal, que fosse inserido nos anais da casa o editorial da edição de 3 de novembro de O Liberal, intitulado “Entre a incompetência e a teimosia”, que trata de propostas que objetivam retroagir direitos já garantidos constitucionalmente em vários setores da sociedade, como o Estatuto da Família e o Estatuto do Desarmamento, dentre outros, propostos e patrocinados pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, alvo de inúmeras denúncias de improbidade administrativa.
Confira o editorial.
Entre a incompetência e a teimosia
Revogar o Estatuto do Desarmamento, reduzir a maioridade penal, restringir os direitos familiares a núcleos formados por um homem e uma mulher, dificultar o acesso de mulheres ao aborto legal em caso de estupro. Todas essas propostas têm algo em comum: elas são bandeiras do atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
Há certamente quem defenda algumas delas. Afinal, o deputado deve - espera-se - representar os anseios de pelo menos alguns de seus eleitores. Essas propostas, no entanto, tornam-se problemáticas quando retroagem sobre direitos já garantidos constitucionalmente. No jargão parlamentar, essas são matérias vencidas.
Tais propostas grassam entre os parlamentares porque representam o que há de mais conservador e antidemocrático na política institucional brasileira. Mal conseguem dissimular o que são realmente: consequências canhestras de uma democracia dos interesses mesquinhos, que reduz os debates, momentos sociais dos mais produtivos, a simples quedas de braço entre grupelhos de apaniguados.
São essas as promessas para um Brasil pós-PT? Criar o estatuto da família é a melhor solução para reduzir as desigualdades, os preconceitos e os crimes de ódio? Armar a população e trancafiar adolescentes é o melhor que conseguem pensar para reduzir a insegurança? Negar às mulheres o direito a um atendimento digno no SUS quando elas mais precisam é alguma piada de mal gosto contra os Direitos Humanos? E a educação? E a saúde?
As bancadas chamadas “BBB” (boi, bala e bíblia) têm total legitimidade para levar suas propostas ao parlamento, mas, no Brasil de preços altos, das filas do desemprego cada vez maiores, de um sistema de saúde ineficaz e desrespeitoso, da educação básica e fundamental de péssima qualidade, da insegurança crescente nas ruas, não é possível que não haja proposições voltadas para o que realmente importa.
Há, no mínimo, um desvio de foco. E aquelas figuras que poderiam definir as prioridades para começar a tirar o país do buraco - sim, só para começar, pois qualquer recuperação financeira e da credibilidade de um país e de um governo leva tempo - estão ocupadas no jogo do “toma lá, dá cá”. Jogam com duas máscaras: a da situação e a da oposição. E escondem o próprio rosto.
Mas o povo já começa a se mobilizar: no último sábado, brasileiros e brasileiras foram à Avenida Paulista contra esse tipo de discurso, contra esse tipo de política. E as máscaras começam a cair: a Procuradoria Geral da República descobriu contas na Suíça, delatores começam a apontar os beneficiários de propinas...
Nada disso importa. Esse tipo de política é aquela do “quanto pior, melhor”. Mesmo contra os anseios de metade do parlamento, mesmo debaixo da enxurrada de acusações, só o poder importa. E, enquanto puder achacar e tumultuar o que já está bastante deteriorado, essa política não vai desistir. O País está entre a incompetência e a teimosia.
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