* Arnaldo Jordy
No dia 13 de julho, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 26 anos de vigência. A Lei 8.069, que atendia a exigência da Constituição Cidadã de 1988, surgiu para superar a visão reducionista, que ainda prevalecia com o chamado Estatuto do Menor.
Os especialistas no direito da infância e da juventude consideram esta uma das mais importantes legislações do processo de redemocratização do estado brasileiro. Carlos Nicodemos, por exemplo, disse que o ECA era a “chama acesa da Era dos Direitos”, numa referência a Norbeto Bobbio.
De fato, o ECA é uma daquelas legislações surgidas após o fim do regime militar, na tentativa de nos qualificar como sociedade, tentando mostrar o caminho da civilização, do respeito ao direito e da melhoria do ser humano. O ECA, diferentemente do Estatuto do Menor, não era uma lei só para punir, ainda que ali se encontrem as medidas socioeducativas, que são a forma de sanção aos atos infracionais cometidos por adolescentes. É, ao contrário, uma Lei para todas as crianças e adolescentes, independente da camada social na qual ela nasceu.
Para chegarmos a esta legislação avançada que é o ECA, um longo caminho foi percorrido. O artigo 227 da Constituição de 1988 estabelece a garantia da proteção integral das crianças e adolescentes. O Brasil foi o primeiro país a assinar a Convenção dos Direitos das Crianças da Organização das Nações Unidas, que passou a valer a partir 20 de outubro de 1990. Essa foi a base institucional para a constituição do ECA. Digo Institucional porque a sociedade, também, se mobilizava, chegando a constituir o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, que juntamente com outras entidades de defesa dos direitos de crianças e adolescentes e profissionais da área social, por toda a década de 80, vinham tentando dar um basta nas práticas excludentes que relegavam nosso futuro ao fracasso fatídico, versado por Chico Buarque na canção “Meu Guri”.
A dívida social do Estado com nossas crianças é dramática. São mais de três milhões de jovens e crianças menores de 16 anos em situação de vulnerabilidade. A escola, que outrora era um porto seguro para qualquer família, está vulnerável. Estudo do IBGE sinaliza que de cada 10 jovens brasileiros no ensino médio, quatro já sofrem de violência física. Pesquisa encomendada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) sobre o assassinato de crianças e adolescentes no Brasil, aponta a existência, no ano de 2013, de 10.520 casos, equivalendo 29 mortes ao dia.
Nossa Carta diz que todas as crianças e adolescentes devem estar seguras, bem alimentados e com acesso à educação. Em vez disso, estão sendo recrutados pelo tráfico, praticando furtos, assaltos e, lamentavelmente, sendo mortos. Essa é a grande contradição que não deve ser minimizada. Poderia ser, ainda, bem maior, não fosse a fundamental atuação de nossos conselheiros tutelares. Portanto, penso que o grande desafio, após 26 anos do ECA, ainda é a sua efetiva implementação.
Por outro lado, é preciso reconhecer as limitações do poder público em relação ao trabalho de acompanhamento e ressocialização do adolescente que comete ato infracional. É possível afirmar que a estrutura disponibilizada para atender adolescentes submetidos a medidas socioeducativas de liberdade assistida ou prestação de serviço à comunidade é precária. Cabe às prefeituras e aos Estados fazer cumprir essas medidas, com estrutura em instituições capazes de permitir a ressocialização desses jovens, além de garantir, é claro, condições dignas de trabalho para os conselheiros tutelares e conselheiros de direito, outra obrigação do Poder Local.
Por isso, como cidadão e parlamentar, defendo que sejam garantidos projetos e medidas que possam melhorar e implementar o ECA, como ajustar o tempo de internação para aqueles que necessitam de cuidados maiores em razão da reincidências de atos infracionais. Que sejamos capazes de efetivar as políticas públicas de atenção e priorização das crianças e adolescentes e jamais retroceder, porque entendo que os gravíssimos problemas que enfrentamos em termos de criminalidade são sintomas de uma sociedade doente que necessita distribuir riquezas, avançar no sentido de desenvolver conhecimentos e oportunidade de emprego e renda, sobretudo, à população jovem e desassistida do Brasil.
*Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS/PA.