Da Agência Câmara
Reportagem – Maria Neves
Edição – Newton Araújo
Participantes do seminário sobre políticas públicas de combate à exploração sexual infantil e o turismo sexual, nesta quarta-feira, afirmaram que é fundamental implementar mudanças culturais para coibir o abuso de menores. O evento foi promovido pelas comissões de Turismo e Desporto; e de Direitos Humanos e Minorias.
Para o consultor da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente, Renato Roseno, apenas punições mais severas não resolve o problema, é necessário inverter a lógica vigente para colocar a dignidade das vítimas no centro do sistema. Atualmente, segundo ele, todo o aparato legal baseia-se na punição e, com isso, tem o agressor com prioridade. Nesse contexto, argumenta que “a criança é transformada quase unicamente em fonte de informação criminal”. Feita a notificação, o Estado não oferece mais nenhum apoio para que ela altere sua situação de vida, acrescenta.
Na opinião do especialista, a lei deveria prever, por exemplo, a suspensão do tempo de prescrição dos crimes para que a vítima possa decidir depois de adulta se quer ou não enfrentar o processo legal. Atualmente, as regras processuais são as mesmas para casos que envolvem menores e adultos. “Com essa lógica de crime e castigo, a criança fica ao léu”, sustenta.
Crianças invisíveis
A consultora da Organização Internacional do Trabalho, Thais Faria, concorda que, “enquanto não se abolir a mentalidade escravocrata e mudar os estereótipos vigentes, não adianta ter a melhor lei do mundo”. Thais defende que as crianças exploradas “são invisíveis, ou, quando aparecem, incomodam” e são abusadas porque os exploradores acham que elas não têm valor.
Para a especialista, a melhor forma de combater o problema é por meio da alteração de princípios. “Enquanto a sociedade for estratificada, com pessoas de maior qualidade, de menor qualidade e de qualidade nenhuma, vai continuar sem encontrar o caminho para a democratização dos direitos.”
No entanto, Thais reconhece a importância do aprimoramento legal. Segundo disse, de 2005 a 2011, houve grandes mudanças no Código Penal, “o que é raro”. Dentre os principais progressos, ressaltou a tipificação da exploração sexual de meninos e meninas como crime, assim como o estupro de vulnerável, independentemente do sexo. “Tem também a definição desse tipo de conduta pela internet, o que era uma dificuldade.”
Conscientização
A diretora da ONG da Davida, Gabriela Leite, também acredita que a melhor forma de combater a exploração sexual de menores é por meio da conscientização. De acordo com ela, o maior número de casos de exploração envolve brasileiros, na maioria das vezes, da própria família da vítima. De acordo com a militante, levantamento realizado pela Davida em todos os relatórios do Disque Denúncia, desde 1997, mostra que somente 0,68% dos registros referem-se a turismo sexual.
Gabriela sustentou ainda que o relatório da CPI da Câmara e do Senado, que tratou do assunto, traz 79 casos comprovados, de exploração. Desses, segundo afirma, apenas 4,2% relacionavam-se ao turismo sexual. “Os casos restantes envolviam a presença de políticos, juízes, pastores e de um padre”, disse.
A ativista acrescentou ser evidente que existem casos de abusos relacionados com o turismo sexual, “mas em muito menor número do que nas famílias brasileiras, e é preciso discutir isso com honestidade, do contrário vamos continuar trabalhando com o improvável”.
Crescimento
Já a representante da ONG "Coletivo Mulher Vida", Rosana França, ressaltou uma faceta inesperada do crescimento econômico, que leva obras para o interior do País – o possível aumento da exploração sexual de crianças e adolescentes. De acordo com ela, “onde tem muitas obras para a Copa no interior de Pernambuco, há um contingente enorme de adolescentes grávidas”.
Já o consultor Renato Roseno destacou a importância de pensar as consequências sociais de grandes investimentos, que envolvem o deslocamento de grandes contingentes humanos. Em sua concepção, “o impacto social deve ser considerado de tal forma relevante que impeça o empreendimento”. Ele defende, por exemplo, uma lei que proíba a concessão de financiamento público para empresas que violem os direitos humanos.
Um dos autores do requerimento para a realização do seminário, o deputado Luiz Couto (PT-PB) explicou que já existe proposta semelhante na Câmara, de que foi relator. “É um projeto do deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), que visa impedir instituições públicas de conceder empréstimos a essas empresas”, disse.