sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

ARTIGO - Não há desenvolvimento sem ciência e tecnologia

    
  
* Arnaldo Jordy
    
Uma notícia que pode ter passado despercebida na semana seguinte à tragédia que abalou o Brasil, a morte em um acidente aéreo do ministro Teori Zavascki, do STF, a poucos dias de homologar a delação dos executivos da Odebrecht, e abrir novas frentes de investigação na Lava Jato. A notícia saiu publicada no site da prestigiada revista científica “Science”, com o título traduzido: “Diante do cenário do fim do mundo, cientistas consideram fugir do Brasil”.
  
O tema da reportagem é a fuga de cérebros, mais uma consequência da grave crise econômica que nos atinge há pelo menos três anos, e que já deixou, em seu efeito mais trágico, 13 milhões de brasileiros desempregados.
  
O Estado brasileiro, quebrado pelo governo anterior, com efeitos sobre o orçamento, que, de maneira inédita, foi negativo no Brasil em 2016, num dos sinais do desgoverno, deixa de transferir recursos os Estados, muitos deles sem recursos até paga manter em dia o pagamento de salários ao funcionalismo público, como é do caso do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul. Com isso, todas as outras obrigações do Estado ficam comprometidas.
  
A reportagem destaca o declínio do apoio federal à ciência no Brasil, que minou fundos para bolsas de estudo e infraestrutura de laboratórios. A agência de financiamento do Rio de Janeiro, a Faperj, por exemplo, cortou fundos para 3.670 projetos de pesquisa. Em São Paulo, a Fapesp, com direito a 1% das receitas fiscais estaduais, receberá 0,89% do total este ano, com uma redução de US$ 35 milhões, informa a Science em sua reportagem, que traz vários exemplos de cientistas que estão deixando o Brasil, para dar continuidade às suas pesquisas em outros países. Uma perda inestimável, já que o Brasil investiu muito na formação desses cérebros, e agora os vê levar seu conhecimento para outros países.
   
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), principal agência de fomento à pesquisa no país, não sabe como fará para pagar suas bolsas este ano, com um orçamento total 12% menor que o de 2016 (R$ 1,67 bilhão, comparado a R$ 1,91 bilhão em 2016). Sem contar a inflação acumulada no ano, que foi de 7%, e descontados os gastos com pessoal e reserva de contingência, há um pequeno aumento de 2,6% (abaixo da inflação), segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).
  
O orçamento apertado já era esperado pelos cientistas. A surpresa foi ver, após a aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA), que R$ 1,1 bilhão dos recursos destinados ao pagamento de bolsas da agência foi colocado na chamada Fonte 900, o que significa que esses recursos não têm origem definida, são condicionados à disponibilidade de verbas adicionais futuras, diferentemente da Fonte 100, que é vinculada ao Tesouro Nacional e tem alocação garantida.
  
As consequências disso são danosas para o futuro do país, pois a produção científica e sua aplicação prática são fundamentais para o desenvolvimento de qualquer Nação. Não haverá progresso sem cérebros para pensar nas transformações que o Brasil precisa. A indústria de base tecnológica está, justamente, no outro extremo das atividades produtivas que desenvolvemos hoje no Pará, por exemplo, baseadas na exploração de produtos primários, as chamadas commodities, para exportação.
   
Há mais de 500 anos vivemos de explorar aquilo que a terra nos dá, seja madeira, seja minério. No entanto, temos uma diversidade biológica impressionante. Na Amazônia, convivem em harmonia mais de 20% de todas as espécies vivas do planeta, sendo 20 mil de vegetais superiores, 1.400 de peixes, 300 de mamíferos e 1.300 de pássaros, sem falar das dezenas de milhares de espécies de insetos, outros invertebrados e micro-organismos. Estima-se que existam mais espécies vegetais num hectare de floresta amazônica de que em todo o território europeu.
   
O potencial científico disso tudo é impressionante. Nossos indígenas, por exemplo, foram cientistas na prática, durante milhares de anos, ao desvendar as propriedades medicinais de tantas espécies vegetais, em domesticar plantas para nossa alimentação e em mostrar como viver na floresta sem destruí-la.
  
Precisamos do conhecimento e da ciência mais do que nunca, para deixarmos o atraso para trás em termos produtivos, da mesma forma como precisamos da educação básica e de um ensino médio qualificado para que a população brasileira assuma um novo patamar de progresso.
  
A nossa realidade, no entanto, exige eleger prioridades, e entre elas, devem estar a educação, a ciência e a inovação tecnológica. São inaceitáveis os atuais indicadores, que estão entre os piores em diversos rankings globais da educação. O mais recente deles, o Programme for International Student Assessment (Pisa, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes), uma avaliação comparada aplicada a estudantes na faixa dos 15 anos, idade em que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países, deixou o Brasil entre as oito piores colocações, atrás de atrás de países como Trinidad e Tobago, Costa Rica, Qatar, Colômbia e Indonésia.
  
A sociedade está, agora, considerando os limites de tetos nos gastos públicos, decorrentes do desequilíbrio fiscal, conclamada a definir suas prioridades e sem dúvida o investimento em educação, ciência e tecnologia, estão entre eles.
  

* Arnaldo Jordy é deputado federal pelo PPS/PA
  
  

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