sexta-feira, 20 de abril de 2018

ARTIGO - A Lava Jato avança

   
* Arnaldo Jordy
  
Quando o Supremo Tribunal Federal tornou réu o senador Aécio Neves, nessa terça-feira, 17, por corrupção passiva e obstrução da justiça, mostrou o quanto o sistema judicial brasileiro vem mudando nos últimos anos e como tem conseguido livrar a política de figuras que envergonham a sociedade, apesar das barreiras que ainda existem, entre as quais, o foro privilegiado, que torna a condenação demorada ou até mesmo inviável para quem tem mandato ou cargo no governo. Mesmo assim, não são poucos os figurões da política e do mundo empresarial que passaram a responder por desvios, fraudes e outras falcatruas caracterizadas como crimes de "colarinho branco", aqueles que, pela tradição brasileira, nunca eram punidos.
   
Algo mudou e ao contrário do que muitos insinuam, mudou pra valer. Grandes empresários como Marcelo Odebrecht, Eike Batista e outros, além de políticos poderosos como Eduardo Cunha, Sérgio Cabral e José Dirceu, sentiram o gosto amargo de ficar atrás de uma cela e de ter que pegar o balde e a vassoura para fazer a limpeza das dependências que ocupam, algo impensável em anos atrás, quando se dizia que somente pobres e negros iam para a prisão no Brasil. Isso parece estar mudando e não é a toa que a mais recente pesquisa do Datafolha revela que 84% dos brasileiros acham que a Lava Jato deve continuar.
   
Ainda persiste a sensação de impunidade, decorrente da lentidão da Justiça, sobretudo nas esferas superiores, nas quais são julgados os detentores de foro privilegiado. São muitos os casos de prescrição ou de punição que chega muito tarde, como no caso de Paulo Maluf, que, aos 86 anos e doente, pode alegar razões humanitárias para não ficar na prisão. Talvez por conta desse conhecimento da lentidão da Justiça é que 57% dos entrevistados pelo Datafolha também são favoráveis à prisão em segunda instância, que tem o poder de evitar a procrastinação da qual lançam mão tantos processados, que contratam caríssimas bancas de advogados para evitar o peso da lei. Aí resulta um ponto de convergência entre o advogado de Aécio, Alberto Toron, e o de Lula, Guilherme Batochio, que pediram juntos a interferência da OAB contra as prisões em segunda instância, o que acabou rejeitado. 
   
Antes disso, é bem possível que Aécio fosse um desses cidadãos que achava que nunca seria alcançado pelos rigores da Justiça, tanto que é que fez campanha presidencial em 2014 com um discurso de ética contra a notória corrupção que grassava nos governos petistas, enquanto, por detrás dos panos, negociava pagamentos e vantagens da mesma forma que faziam aqueles que estavam no governo que ele criticava. 
   
A ironia amarga da queda de Aécio Neves é que os dois primeiros colocados nas eleições de 2014 já foram alcançados pela lei e se encontram, na prática, alijados das próximas eleições: Juntos, Aécio e Dilma receberam mais de 100 milhões de votos nas urnas no segundo turno da eleição, votos que não souberam honrar e, por isso, acabaram punidos. Mas o que deve ser ressaltado é que, mesmo com o foro privilegiado, as ações contra o senador mineiro estão caminhando, em uma demonstração de que não há seletividade ou tentativa de proteger um ou outro partido nas investigações da Lava Jato, operação que combate a corrupção de forma estrutural e que utiliza critérios técnicos nas investigações, atingindo partidos de todas as tendências, do PT ao PSDB, do PMDB ao PP, todos estão na mira Justiça e devem ser alcançados pela lei mais cedo ou mais tarde. 
   
Cabe aos cidadãos reivindicar a mudança nas leis para que seja restrito o foro privilegiado, que hoje beneficia 54.900 pessoas no Brasil e deixou de ser um instrumento para evitar perseguições judiciais na primeira instância, para se tornar um expediente que impede o cumprimento da Justiça para aqueles que podem pagar caro por suas defesas. É de se esperar, portanto, que com o fim do foro privilegiado, a Lava Jato tenha ainda melhores condições de continuar a passar o Brasil a limpo. A mobilização da sociedade é fundamental para pressionar o STF e o Congresso para que façam essa mudança.
  
  
* Arnaldo Jordy é deputado federal - PPS/PA
  
  

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