sexta-feira, 6 de abril de 2018

ARTIGO - Alvo era a Lava Jato

   
* Arnaldo Jordy
   
Prevaleceu a coerência e a esperança de que algo mude para melhor no país no julgamento que entrou pela madrugada desta quinta-feira, no Supremo Tribunal Federal, no qual foi negado o pedido de habeas corpus para o ex-presidente Lula. Não tenho nada pessoal contra Lula, que fez um bom primeiro governo no sentido na redução da desigualdade e distribuição de renda por meio de programas sociais. Mas, no julgamento de ontem, além da análise do mérito do caso em si, a concessão do habeas corpus representava uma jurisprudência perigosa para os julgamentos dos demais réus da Lava Jato. Isso, estranhamente, uniu ministros que historicamente têm se atacado e se colocado em lados opostos, como Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello.
      
Me parece óbvio que a intenção deles não era à de salvar Lula da cadeia para atender aos apelos dos petistas, mas sim proteger os diversos barões de colarinho branco apanhados pela operação e dar um basta na própria Lava Jato, desmoralizando o juiz Sérgio Moro. Felizmente, não conseguiram. 
    
A prisão de um ex-presidente, seja ele quem for, por corrupção, não é para ser festejada, mas não se pode querer que o fato de ter sido presidente mude o curso do processo. Além disso, não há o risco de se estar condenando um inocente. Lula foi julgado por um total de 15 juízes em diferentes instâncias e, no caso do julgamento de ontem, no STF, dos seis votos contra Lula, cinco foram dados por ministros nomeados pelos governos do PT. A lei é para todos e o Brasil precisa passar por isso para que algo de melhor surja no horizonte. O momento não é de recuar, mas de avançar no sentido de fortalecer as instituições, a Justiça e a operação Lava Jato. Não tenho a ilusão de que a corrupção irá acabar, mas não tenho dúvida de que é preciso combater esse conluio político-empresarial que causa prejuízos superiores a 200 bilhões de reais por ano no Brasil e que tira dinheiro da saúde, da educação e da segurança. 
   
A jurisprudência que vigora no Supremo desde 2016 tem ajudado o país a colocar na cadeia muitos implicados em crimes de colarinho branco, como os ex-presidentes da Câmara Eduardo Cunha e Henrique Alves, governadores como Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro; e mega empresários como Eike Batista e Marcelo Odebrecht, dentre tantos outros. Seria de um casuísmo atroz e prejudicial ao país mudar agora a execução da pena a partir do segundo grau de jurisdição. Em dois anos, em todo o território nacional, foram quase 10 mil casos judiciais em que condenados pelos mais diversos crimes, tais como estupro, pedofilia, tráfico de drogas, homicídio e outros, passaram a cumprir pena logo após a confirmação da sentença em segunda instância. Todos eles poderiam ser beneficiados pela mudança na regra.
   
É preciso lembrar que a mudança para permitir a execução da pena em segunda instância não é uma novidade surgida há dois anos, mas era a regra adotada no Código Penal Brasileiro de 1941 até 2009, quando foi amenizada por ocasião dos recursos contra o cumprimento das penas dos condenados no Mensalão. Mudá-la agora, novamente, ignorando os bons resultados que têm sido obtidos pela Justiça na punição de corruptos causaria um retrocesso no sistema judicial brasileiro e seria um abalo para a operação Lava Jato. Muitos dos presos que hoje cumprem pena em Curitiba ou em outros Estados teriam argumentos para solicitar suas solturas. Seria um favorecimento à impunidade que o povo brasileiro não poderia aceitar.
   
O ministro relator do pedido de habeas corpus de Lula, Edson Fachin, que, aliás, era identificado como simpatizando do petismo antes de sua escolha para o STF, em seu voto pela rejeição do pedido, lembrou que o país já sofreu diversas censuras em organismos internacionais de direitos humanos, como a OEA, por conta da impunidade e da dificuldade em fazer com que condenados efetivamente cumpram suas penas. A impunidade é o mal contra o qual clamam tantas famílias de inocentes que morrem nas mãos de assassinos pelo país todos os dias. 
   
Quero lembrar que quem escapa da prisão por conta dos mecanismos que levam à impunidade não são os pobres, ao contrário, estes é que abarrotam as prisões por crimes muitas vezes menores, passam longos períodos presos sem julgamento, sem direito a defesa, sujeitos à violência e à cooptação pelo crime organizado. Quem evita o cumprimento das sentenças são as pessoas que podem pagar advogados caros para procrastinar a execução das penas, especialmente nos crimes de corrupção. O problema se agrava mais ainda nos tribunais superiores, onde estão o terceiro e quarto graus de jurisdição, justamente por causa do volume de processos que sobrecarregam essas Cortes e da infinidade de recursos que os réus com poderio econômico para contratar grandes bancas de advogados têm condições de interpor até que alcancem a prescrição de seus crimes. Isso precisa mudar no Brasil e não podemos recuar nos passos que demos adiante contra a cultura da impunidade.
      
  
* Arnaldo Jordy é deputado federal - PPS/PA
   
   

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