* Arnaldo Jordy
Este ano se comemoram os 28 anos da sanção do Código de Defesa do Consumidor (CDC), lei que ajudou a conscientizar o cidadão sobre os seus direitos em qualquer relação de consumo, sejam bens ou serviços. Infelizmente, no caso dos serviços públicos ou de suas concessões à iniciativa privada, ainda falta muito para que o CDC seja aplicado, especialmente no que se refere ao respeito que merece o cidadão, situação que muita gente desconhece, tão acostumados que estão a receber serviços públicos ruins, tais como transporte público, abastecimento de água e saúde pública.
Mas, no caso da energia elétrica, a privatização e as sucessivas transferências dentro da iniciativa privada são motivos para que o consumidor anseie a tão propalada eficiência que a Celpa não tinha quando era uma empresa pública do governo do Estado e não tinha condições de aumentar seu investimento. A gestão mais eficiente da iniciativa privada era tida como uma das vantagens da privatização.
Entre as surpresas desagradáveis que o consumidor teve na pós-privatização está o preço das tarifas. O mais recente estudo do Dieese, publicado em agosto do ano passado, mostra que o reajuste acumulado para o consumidor residencial do Pará desde 1998, quando a Celpa foi privatizada, chega a 550%, enquanto que a inflação para este mesmo período de 20 anos desde o leilão, a serem completados este ano, medida pelo INPC do IBGE, é de 239%.
A disparada se deu em 19 reajustes seguidos autorizados pela Aneel e muitos percalços no caminho, como o seguro apagão do governo FHC, que foi cobrado anualmente até 2005; o reajuste da alíquota do ICMS sobre a energia elétrica, em 2001, que aumentou a tarifa em 27,48% para o consumidor residencial; e ‘tarifaços’ em 2003 (26,38%), 2008 (19,23%) e 2014 (34,34%), no governo Dilma, para coroar uma gestão desastrosa do setor elétrico; além do sistema de bandeiras tarifárias, que permitem o aumento do preço da energia a partir de um gatilho acionado pela falta de chuvas no país e que penaliza todos os consumidores, mas sobretudo os dos Estados produtores, que abastecem de energia o país de energia gerada pelas hidrelétricas e não deveriam ter esse custo adicional.
Todos estes reajustes pesaram mais sobre o consumidor residencial, já que o consumidor industrial usufrui de subsídios e também pode repassar parte dos seus custos para o consumidor. Mesmo assim, o reajuste acumulado para o setor industrial é de 402,79% desde a privatização, segundo o Dieese. A tudo isso se soma o desrespeito com que o consumidor paraense é tratado. Em 2014, já sob o controle da Equatorial, após ter sido vendida pela Rede pelo preço simbólico de 1 real, logo após o primeiro ano, teve um faturamento de mais de R$ 400 milhões.
Houve uma disparada de reclamações contra a Celpa no Procon do Pará, com quase 52% de todas as queixas direcionadas à concessionária de energia, superando as telefônicas. As causas eram cortes indevidos e cobranças exorbitantes para o mesmo padrão de consumo. Muitas vezes, o consumidor era ludibriado e induzido a reconhecer esses débitos. Recentemente, o Ministério Público Federal divulgou que houve mais de 5 mil reclamações por cobranças indevidas contra a concessionária no período nos últimos dois anos, e recomendou que a Aneel intensificasse as fiscalizações sobre a empresa.
Em 2014, fiz uma audiência pela Câmara dos Deputados no Centur, cujo auditório ficou lotado de pessoas com reclamações contra a concessionária, em um clima de revolta que continua até hoje. Também levei consumidores ao Ministério Público do Estado do Pará para que tomasse providências. Termos de Ajuste de Conduta foram assinados pela empresa, que criou mecanismos para que as reclamações não chegassem mais em peso ao Procon, mas o desrespeito com o consumidor continuou nas cobranças exorbitantes e nos cortes abusivos.
O artigo 22 do CDC assegura que os serviços públicos devem ser adequados, eficientes e seguros. Os serviços essenciais e contínuos, como água e luz, são abrangidos também pelo artigo 42, parágrafo único, que admite restituição em dobro das cobranças indevida. Os artigos 6 e 14 do CDC tratam do direito à reparação integral dos danos causados.
O paraense tem motivos para se considerar injustiça por pagar uma das tarifas mais altas do mundo, já que está entre os maiores produtores de energia do País: 17 milhões de quilowatts de Tucuruí, Belo Monte e outras. É o Estado que mais exporta energia, mas consome apenas 14% do que produz. Os 86% restantes abastecem outras unidades da federação, sem que o Estado receba um centavo de impostos, pois a cobrança do ICMS se dá no consumo. Para completar a tragédia, ainda temos 2 milhões de paraenses sem acesso a energia firme e de qualidade. Onde estão os investimentos obrigatórios pela concessionária? Em vez disso, o consumidor ainda tem que suportar a propaganda enganosa feita pela concessionária, que continua sugando de forma ilegal, exorbitante e arbitrária o consumidor paraense. O Ministério Público e as autoridades deveriam impedir essa tentativa de ludibriar o consumidor.
Por estes motivos, apresentei em 2015 o Projeto de Lei 1.524, para excluir do rateio da bandeira vermelha os Estados que consomem menos de 50% da energia hidrelétrica produzida em seus territórios, para livrar os consumidores paraenses de mais essa cobrança. Mas a melhor iniciativa contra o desrespeito da concessionária de energia é a busca de informação e a mobilização da sociedade, que deve fazer valer os seus direitos por um serviço público de qualidade, eficiente e que não vise somente o lucro a qualquer preço, principalmente quando esse preço é o sacrifício da população.
* Arnaldo Jordy é deputado federal, líder do PPS na Câmara
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