* Arnaldo Jordy
O Supremo Tribunal Federal mostrou ao decidir ontem por quase unanimidade (10 votos a 1) encaminhar à Câmara dos Deputados a segunda denúncia do ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer, que não está disposto a recuar no esforço de combater a corrupção, ao lado da Procuradoria, da Polícia Federal e de todos que fazem a operação Lava Jato. A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, já havia dado o alerta na sessão anterior, ao avisar que "a Lava Jato não vai parar", apesar da mudança na chefia do Ministério Público e de questionamentos à condução da colaboração dos irmãos Joesley e Wesley Batista. Foi a segunda derrota seguida do governo no Supremo, depois de não conseguir afastar o procurador Rodrigo Janot da investigação sobre Temer.
A segunda denúncia contra Temer, mesmo tratando de alguns fatos anteriores ao início do seu mandato, desnuda com base em delações, especialmente do corretor Lúcio Funaro, o esquema corrupto de lideranças do PMDB na Câmara, envolvendo ministros do atual governo: Moreira Franco e Eliseu Padilha, com ex-ministros e ex-deputados que estão presos: Henrique Alves, Geddel Vieira Lima, Eduardo Cunha e Rocha Loures, envolvidos em cobranças de propina da Odebrecht e da JBS, em troca de vantagens na Caixa e na Petrobras, durante o governo de Dilma Rousseff. Temer seria um dos líderes do grupo, juntamente com Cunha, no que a denúncia chamou de organização criminosa. Funaro relatou ter levado dinheiro vivo para Geddel. Na mesma denúncia, Temer também é suspeito de obstrução de Justiça.
Como se vê, a denúncia é grave e não adianta tentar minimizá-la com argumentos como a estabilidade da economia, que não avança por causa da crise de credibilidade do governo, que continua a dedicar boa parte da sua energia e também recursos à defesa de Temer. Um presidente que governa com apenas 3,4% de aprovação, como constatado na pesquisa CNT/MDA divulgada esta semana, fica na condição de refém dos seus aliados, obrigado a atender a interesses de grupos, que nem sempre são os mesmos da Nação. Por isso, vou votar pela admissão da denúncia na Câmara, que é a permissão para que o Supremo investigue o presidente. Uma vez que o mesmo passe à condição de réu, o seu afastamento entra na pauta do Senado.
O ex-procurador-geral de Justiça, Rodrigo Janot, desnudou o esquema de parte do PMDB na Câmara e também, em outra denúncia, as atividades da suposta organização criminosa de líderes do mesmo partido no Senado. Seis senadores do PMDB foram incluídos no "quadrilhão" e respondem, juntos, a mais de 40 inquéritos de improbidade. São eles: Jader Barbalho, Renan Calheiros, Romero Jucá, Valdir Raupp, Edison Lobão e o ex-presidente José Sarney. Juntos, eles teriam desviado R$ 864 milhões, valor que é 17 vezes maior que a fortuna encontrada no apartamento ligado ao ex-ministro Geddel Vieira Lima.
Não menos graves são as revelações feitas pelo ex-ministro Antônio Palocci sobre as relações do ex-presidente Lula com o patriarca Emílio Odebrecht, numa espécie de pacto que lembra muito os filmes de máfia, num compromisso que continuou no governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Palocci chegou a ser o terceiro nome mais importante na hierarquia dos governos petistas e revelou detalhes sobre o esquema de financiamento ilegal do seu partido, com direito a uma conta sem limite para saques a qualquer momento. Palocci deve ter farta munição para provar o que diz, senão, não ousaria pedir para delatar, sabendo de todas as regras que envolvem o processo.
O Brasil avançou no combate à corrupção e agora, a sociedade espera que a nova procuradora-geral, Raquel Dodge, dê continuidade às investigações dos grandes esquemas que chocaram o país nos últimos anos, reveladas pela operação Lava Jato. Em um momento importante e delicado para o Brasil. Ela terá a chance de mostrar que o combate à corrupção não deve ser personalizado em uma ou outra figura, como o juiz Sérgio Moro ou o ex-procurador Rodrigo Janot, mas deve ser missão institucional do Ministério Público e do Judiciário.
Pela primeira vez se combate a corrupção de forma estrutural. Nunca antes se viu alguns dos empresários mais ricos do país na cadeia por corrupção ativa, como Eike Batista, Marcelo Odebrecht e os irmãos Joesley e Wesley Batista; nem grandes lideranças políticas denunciadas e condenadas por recebimento de propina, como o ex-governador do Rio Sérgio Cabral, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, os ex-ministros Geddel Vieira Lima e Antônio Palocci.
A sociedade não deve aceitar o discurso que tenta justificar a corrupção como prática inevitável. A Lava Jato tem aí o seu maior mérito, provar que é possível combater a corrupção de forma estrutural. São 603 investigados, 314 quebras de sigilo bancário, 185 inquéritos concluídos, 35 sequestros de bens e valores e R$ 79 milhões repatriados. Por tudo isso, a operação merece ter todo o apoio da sociedade. Que cada um, no dia a dia, possa empunhar essa bandeira. A ética precisa prevalecer na política e na sociedade e todos estão sujeitos a investigação. Ninguém deve estar acima da lei.
* Arnaldo Jordy é deputado federal, líder do PPS na Câmara