sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Câmara aprova projeto que possibilita repressão ao tráfico de pessoas


  
Da Agência Câmara
Por Eduardo Piovesan
   
O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira (26), o Projeto de Lei 7370/14, que traz várias mudanças na legislação para coibir o tráfico nacional ou internacional de pessoas, como o acesso facilitado a dados de telefonia e internet. A matéria será analisada ainda pelo Senado.
  
O texto aprovado é um substitutivo da comissão especial que analisou este projeto, oriundo do Senado, e o PL 6934/13, da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara sobre o Tráfico de Pessoas, cujos trabalhos se encerraram em maio do ano passado. O projeto do Senado também resultou de uma CPI com a mesma finalidade que atuou em 2011.
  
De acordo com o substitutivo aprovado, do deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), o delegado de polícia ou o membro do Ministério Público poderão requisitar de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos de crimes como o tráfico de pessoas, extorsão mediante sequestro e envio de criança ao exterior para adoção sem o trâmite legal.
  
Localização de vítimas
  
As empresas de transporte, por exemplo, deverão manter por cinco anos os dados de reservas e registros de viagens para acesso direto e permanente do membro do Ministério Público ou do delegado de polícia.
  
Igual prazo deve ser seguido pelas concessionárias de telefonia fixa ou móvel quanto aos números discados e atendidos em ligações locais, interurbanas e internacionais para investigar o crime de tráfico de pessoas.
   
Para fins de investigação criminal, o delegado ou o Ministério Público poderão requisitar às empresas de telecomunicações os meios técnicos adequados disponíveis para ajudar na localização da vítima ou dos suspeitos de um delito em curso (por meio da localização de celular, por exemplo).
  
Sobre este aspecto, o relator aceitou sugestões nas negociações em Plenário e especificou que o juiz terá 12 horas para expedir a autorização pedida pelo Ministério Público ou pelo delegado. Se ela não for expedida, essas autoridades poderão requisitar às empresas a colaboração imediata, comunicando ao juiz esse acesso.
  
A ideia é evitar possíveis demoras que poderiam impedir a polícia de localizar com agilidade a vítima ou o suspeito.
  
Quanto aos dados de conexão de acesso e de provedores de conteúdo, o acesso é igual ao disciplinado na lei do marco civil da internet (Lei 12.965/14).
    
Protocolo da ONU
  
As medidas da proposta se coadunam com o Protocolo de Palermo, da Organização das Nações Unidas (ONU), referência mundial para o combate ao tráfico de seres humanos.
  
Segundo o relator do projeto, todas as sugestões na comissão foram acolhidas e formam um importante avanço no combate a esse crime. “O tráfico de pessoas é o terceiro maior no mundo, perdendo apenas para o tráfico de drogas e de armas, movimentando bilhões todo ano”, lamentou Arnaldo Jordy.
    
  
Texto cria regras para vítimas
estrangeiras e adoções internacionais
  
O Projeto de Lei 7370/14 permite aos estrangeiros vítimas de tráfico de pessoas no território nacional requerer o reconhecimento dessa condição e a residência permanente se forem satisfeitos os trâmites aplicáveis à condição de refugiado segundo o Comitê Nacional para os Refugiados (Conare).
  
O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) também é modificado para proteger essa faixa etária. A adoção internacional, por exemplo, somente poderá ser intermediada por organismos credenciados no Brasil, vedada a intermediação por pessoa física.
   
Nesse tipo de adoção, será obrigatória a intervenção das autoridades estadual e federal, sob pena de o processo ser considerado nulo.
  
Já os candidatos deverão ser de país signatário da Convenção de Haia, relativa à proteção das crianças e à cooperação em matéria de adoção internacional.
  
O adotante deverá ainda assinar termo de compromisso de que providenciará a aquisição da nova cidadania pelo adotado.
  
Após a adoção, os organismos credenciados para intermediá-la deverão enviar relatório semestral para as autoridades federal e estadual brasileiras durante os dois primeiros anos da adoção. Depois de cinco anos desse prazo, o relatório será enviado para o posto da rede consular brasileira no país do adotante.
   
Adoção no Brasil
    
Quanto à adoção no Brasil, o texto permite que ela ocorra por candidato domiciliado no País e não cadastrado previamente quando for formulada por pessoa indicada pelos pais de criança maior de três anos com a qual esta mantenha vínculos de afinidade e afetividade.
  
A consulta da criança ou do adolescente por equipe interprofissional ou por profissional qualificado passa a ser obrigatória e não mais “sempre que possível”.
     
  
Para garantir maior proteção,
proposta disciplina trabalho por adolescentes
      
Outro tema tratado pelo Projeto de Lei 7370/14 é o trabalho de crianças e adolescentes, que passa a ser proibido para menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos. Atualmente, a proibição recai para menores de 14 anos com a mesma exceção.
    
Nos casos de representações artísticas e de concursos de beleza, será permitida a participação remunerada de crianças e adolescentes menores de 16 anos apenas com alvará do juiz e condicionada a garantias como cumprimento da frequência escolar, condições dignas de trabalho e acompanhamento educacional, médico, odontológico e psicológico.
  
Trabalho doméstico
  
O substitutivo proíbe o trabalho doméstico para menores de 18 anos e disciplina o trabalho no exterior, que somente poderá ocorrer para o menor de 18 e maior de 16 anos com autorização dos pais e do juiz, ouvido o Ministério Público.
  
A contratação somente poderá ocorrer por empresa devidamente constituída, com garantia de assistência medica e hospitalar, seguro saúde e frequência a instituição de ensino regular.
  
Artistas, atletas e modelos
  
As contratações de menores de idade como atletas segue a regra geral, que exigirá registro da empresa ou entidade nos órgãos competentes.
  
Em relação aos contratos de modelo e manequim, além de eles só poderem ser feitos por pessoa jurídica com registro nos órgãos competentes, será proibido o agenciamento, e a empresa ficará responsável pelo cumprimento do contrato no exterior se o menor for lá trabalhar.
  
Será proibida a realização do contrato de risco, que impõe ao profissional contratado os prejuízos decorrentes da não execução contratual a que não deu causa.
  
Viagens
   
Quanto às viagens desacompanhadas sem autorização expressa do juiz, atualmente o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) prevê sua proibição para toda criança de até 12 anos incompletos. O texto aprovado especifica que a proibição será para menor de 14 anos.
  
O projeto institui também o Dia Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, a ser comemorado, anualmente, em 30 de julho.
  
  
Pena para tráfico de pessoas aumentará
   
O texto aprovado do Projeto de Lei 7370/14 cria uma nova tipologia para o tráfico de pessoas. Ela engloba a previsão existente no Código Penal para esse crime com finalidade de exploração sexual e outras, como adoção, trabalho análogo ao de escravo, remoção de órgãos, células, tecidos ou partes do corpo humano e submissão a qualquer tipo de servidão.
    
A pena aumentará de 2 a 6 anos de reclusão para 5 a 8 anos e multa. Novo agravante é acrescentado, aumentando a pena pela metade se a vítima tiver menos de 14 anos e se o crime for cometido por servidor público no exercício da função.
  
O texto prevê ainda a possibilidade de redução da pena de um a dois terços e cumprimento em regime aberto ou semiaberto no caso de o acusado aceitar as condições da delação premiada que permite identificar rotas do tráfico e localização e libertação de vítimas.
  
Cirurgias
  
Outro novo crime tipificado no Código Penal é o de realizar modificações corporais sem consentimento da vítima, por profissional não habilitado ou em condições que ofereça risco à saúde.
  
A pena, de reclusão de 3 a 5 anos, será aumentada pela metade se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro, se do fato resultar lesão corporal grave ou se a vítima tiver menos de 18 e mais de 14 anos.
  
O aumento é em dobro se, do fato, resultar morte; se o crime for praticado para fins de exploração sexual de vítima de tráfico humano; e se a vítima tem menos de 14 anos.
  
  
Projeto permite ao juiz decretar
sequestro de bens de acusados
  
Outra medida prevista no Projeto de Lei 7370/14, relacionada à fase de investigação, é a permissão para o juiz decretar, a pedido do Ministério Público ou de delegado, o sequestro de bens, direitos ou valores de investigado ou acusado se houver indícios suficientes da prática de tráfico de pessoas.
   
Será possível ainda a venda antecipada dos bens se estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação.
    
A repressão ao tráfico de pessoas poderá ocorrer por meio da formação de equipes conjuntas de investigação e da cooperação entre órgãos do sistema de Justiça e segurança, nacional e estrangeiros.
  
Atendimento à vítima
  
Já o atendimento à vítima direta ou indireta do tráfico de pessoas deve contemplar acolhimento em abrigo provisório, preservação da intimidade e da identidade e prevenção à revitimização no atendimento e nos procedimentos investigatórios e judiciais.
  
Cadastro de criminosos
  
Será criado ainda o Cadastro Nacional de Traficantes de Seres Humanos, que conterá os dados referentes às pessoas que cometerem esse tipo de crime. Esses dados poderão ser compartilhados com países signatários do Procotolo de Palermo.
  
   
(Fotos: Agência Câmara - Gustavo Lima)
  
  

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